
O Arcanjo Miguel de Juan de la Abadia (1490) com a balança da psicostasia, uma obra-prima da pintura aragonesa no Museu Nacional de Arte da Catalunha
A pintura do Arcanjo Miguel, criada por Juan de la Abadia por volta de 1490, é um exemplo notável da pintura aragonesa do século XV (Pijoan). Está exposta no Museu Nacional de Arte da Catalunha em Barcelona e mede 127 x 78 centímetros, pintada em madeira.
A dimensão espiritual da obra transcende os limites da sua época. Juan de la Abadia, ativo de 1470 a 1490 em Huesca, fazia parte da forte tradição dos pintores primitivos espanhóis que uniram a influência flamenga com as necessidades religiosas locais (Velasco). A obra reflete o encontro cultural entre Oriente e Ocidente que caracterizou a Península Ibérica.
Na composição geral, a figura majestosa do Arcanjo se destaca. Ele possui as tradicionais asas de arcanjo, enquanto sua auréola emite luz espiritual através de círculos concêntricos. As cores – vermelho, dourado, marrom – criam uma atmosfera de adoração calorosa que combina a reverência bizantina com a expressividade gótica do século XV (Salcman).
A psicostasia é o tema teológico central. Miguel segura a balança branca da justiça, símbolo do juízo eterno das almas. Na parte esquerda da balança, uma figura branca representa a alma do justo, enquanto à direita, uma figura sombria simboliza o mal. Esta composição dramática reflete a visão medieval da luta eterna entre o bem e o mal, como se manifesta na religiosidade da época em Toledo e outros centros (Juan).
O pilar dórico que sustenta a cena não é apenas um elemento arquitetônico. Ele simboliza a estabilidade da justiça divina, a permanência da fé em relação às paixões humanas efêmeras. O capitel jônico remete à tradição clássica, sugerindo a influência renascentista que começava a permeiar a arte espanhola.
Na base da pintura, uma cena revela os destinos eternos. Duas pequenas figuras aparecem em diferentes posturas: uma ajoelhada em adoração, a outra sombria e abatida. O mármore em degraus do chão, com suas placas brancas e escuras alternadas, intensifica a sensação de severidade judicial e da ordem geométrica que caracteriza o mundo divino.

Detalhe da auréola do Arcanjo, revelando a habilidade técnica do final do período gótico na Espanha
Paleta de Cores e Influências Artísticas
A paleta de cores revela a relação do artista com as influências flamengas que permeavam a Aragão (Velasco). O vermelho intenso do manto do Arcanjo cria um contraste dramático com o branco de seu rosto e asas, enquanto os tons dourados da auréola e dos elementos decorativos conferem um brilho espiritual. A composição das cores não segue apenas critérios estéticos, mas simbolismos teológicos: o vermelho da sacrifício e do amor, o branco da pureza, o dourado da divindade.
O rosto de Miguel expressa uma combinação paradoxal de severidade e compaixão. As características são ideais, distantes do realismo físico, orientadas para a revelação metafísica. A técnica de Juan de la Abadia revela a influência das guildas dos pintores aragoneses que atuaram durante a transição do gótico para o renascimento.
O detalhamento dos tecidos revela a habilidade técnica do pintor. As dobras do manto seguem ritmos naturais, enquanto os padrões decorativos nas vestes remetem a tradições bizantinas que sobreviveram na Espanha através da arte muçulmana. Esta composição cultural caracteriza a identidade única da arte espanhola do século XV.
A obra serve como um documento histórico da vida religiosa da época. Destinava-se a um espaço eclesiástico, onde participaria da experiência de adoração dos fiéis. A psicostasia era um tema central da escatologia medieval, lembrando às pessoas a necessidade de uma vida moral. Através da representação artística, Juan de la Abadia traduziu conceitos teológicos complexos em uma linguagem iconográfica de fácil compreensão.
O valor histórico da pintura vai além de suas qualidades artísticas. Testemunha o encontro de tradições que moldaram a identidade cultural ibérica: a herança bizantina através das dominações muçulmanas, as influências flamengas através das redes comerciais, a tradição latina através da igreja católica. O Arcanjo Miguel de Juan de la Abadia se destaca como um símbolo dessa multiculturalidade que caracterizou a Espanha no final da Idade Média.
Bibliografia
- Juan, M.M. ‘Pintura, devoção e piedade em Toledo no início do século XV’, bilbaomuseoa.eus.
- Pijoan, J. ‘Primitivos Aragoneses’, The Burlington Magazine for Connoisseurs, 1913, JSTOR.
- Salcman, M. ‘San Lucas, Escola Espanhola, Início do Século XV’, Neurosurgery, 1995, journals.lww.com.
- Velasco, A. & Fité, F. ‘Pintura gótica tardia na coroa de Aragão e nos reinos hispânicos’, Annales d’Histoire de l’Art et Archéologie de l’Université de Liège, 1998, brill.com.
- Velasco, A. & Fité, F. ‘Pintura Gótica Tardia na Coroa de Aragão e nos Reinos Hispânicos’, 1998, brill.com.
- Velasco González, A. & Fité i Llevot, F. ‘Pintura Gótica Tardia na Coroa de Aragão e nos Reinos Hispânicos: uma Introdução’, 2018, repositori.udl.cat.
- ‘Pintura Gótica Tardia na Coroa de Aragão e Hispânica’, 2018, books.google.gr.

